Grafeno agraciado
Nobel de Física vai para dois cientistas russos que isolaram material de carbono com espessura de um átomo e que pode levar a uma nova geração de aparelhos eletrônicos, além de ajudar a desvendar alguns fenômenos da física quântica.
Por: Fred Furtado
Publicado em 05/10/2010 | Atualizado em 07/10/2010
Grafeno é o nome dado ao material bidimensional formado por átomos de carbono unidos em um plano atômico com a estrutura do grafite (arte: Alexander Alus – CC BY-SA 3.0).
Imagine uma folha formada por uma trama de carbono disposto em hexágonos planos e com um átomo de espessura. Este é o grafeno, material cem vezes mais forte que o aço, praticamente transparente e capaz de conduzir eletricidade e calor mais eficientemente que outros materiais.
Andre Geim (esq.) e Konstantin Novoselov, os dois físicos russos da Universidade de Manchester contemplados com o Nobel de Física de 2010 (fotos: Simion Eugen/CC e Univ. de Manchester).O material valeu o Nobel de Física deste ano para os físicos russos que conseguiram isolá-lo em 2004: Andre Geim e Konstantin Novoselov, ambos da Universidade de Manchester, na Inglaterra.
O isolamento do grafeno tomou a comunidade científica de surpresa, pois não se acreditava que era possível isolar um material tão fino de maneira estável – as folhas se dobrariam, amassariam ou desapareceriam.
Essa finura abriu as portas para uma série de possibilidades, como o estudo de fenômenos quânticos e a criação de novos dispositivos eletrônicos.
“Nos últimos anos, o número de artigos científicos sobre esse tema pulou de cem para mais de cinco mil”, revela o físico Carlos Albertos dos Santos, da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila), em Foz do Iguaçu (PR).
Grafite e fita adesiva
O grafeno não é o primeiro material de carbono que se conhece com espessura de um átomo. O fulereno (esfera feita da mesma trama, cuja descoberta rendeu o Nobel de Química de 1996) e o nanotubo de uma camada já haviam sido isolados em 1985 e 1993, respectivamente. No entanto, apesar de conhecido, o grafeno continuava ausente dos laboratórios.
A grafite usada para escrever nada mais é do que três milhões de folhas de grafeno empilhadasNa verdade, obter várias camadas de grafeno não é difícil. A grafite usada para escrever nada mais é do que três milhões de folhas desse material empilhadas.
Ao escrevermos ou desenharmos, a grafite libera pedaços com várias camadas, ou mesmo uma. O desafio era produzir essa folha única, o grafeno, de modo controlado.
Geim e Novoselov conseguiram isso usando fita adesiva para descascar pedaços de grafite. Estes eram então colocados sobre uma base de carbeto de silício, que ajudava a identificar o grafeno. “Este material altera o padrão de difração [espalhamento] da luz oriunda do silício. É assim que os pesquisadores sabem que o grafeno está presente”, explica Santos.
A imagem acima, obtida em um microscópio eletrônico, mostra uma folha de grafeno amarrotada sobre um suporte de silício. O grafeno tem a aparência de seda jogada sobre uma superfície lisa. A lateral da imagem tem 20 mícrons de dimensão (foto: Univ. de Manchester).
Tunelamento e transistores
Devido à sua estrutura, o grafeno permite o estudo de fenômenos como o efeito de tunelamento, no qual uma partícula atômica atravessa uma barreira que normalmente impediria seu movimento. Em determinadas circunstâncias, elétrons viajando pelo grafeno apresentam esse efeito.
Aplicações práticas para o grafeno não faltam, mas por enquanto a maioria só existe na teoriaAplicações práticas para o grafeno não faltam, mas por enquanto a maioria delas só existe na teoria.
Uma das mais estudadas é a criação de transistores com esse material. Eles seriam mais rápidos que os atuais, feitos de silício, e, devido ao seu tamanho, permitiriam a criação de chips de computador menores.
Além disso, a transparência do grafeno, de quase 98%, e sua condutividade o tornam apropriado para a confecção de telas sensíveis ao toque e painéis solares, por exemplo.
Plástico com grafeno adicionado à sua estrutura também conduz eletricidade, bem como se torna mais resistente física e termicamente.
Nobel-Ig-Nobel
Andre Geim se torna o primeiro pesquisador no mundo a acumular tanto um Nobel quanto um Ig Nobel – que, segundo o slogan, premia os trabalhos que “fazem primeiro rir e depois pensar”. Os vencedores deste ano já foram anunciados.
Geim levou a premiação em 2000 com o também físico Michael Berry (entrevistado na CH 195) por experimentos para promover a levitação de rãs.
Descoberta ao acaso durante uma ‘experiência de sexta-feira à noite’A história por trás da pesquisa ganhadora do Nobel também tem sua graça. De acordo com Santos, Geim e Novoselov estudavam originalmente supercondutores.
Durante uma ‘experiência de sexta-feira à noite’ – tempo reservado para testar teorias exóticas – em que queriam saber se era possível usar grafite para dispositivos eletrônicos, descobriram que o método de limpeza do material poderia ser usado para obter grafeno.
“A obtenção do grafeno é uma realização fantástica. Não é à toa que, diferentemente do normal, o espaço de tempo entre a descoberta e a premiação, neste caso, foi de apenas seis anos”, destaca Santos.
As propriedades do grafeno e suas aplicações industriais já foram tratadas pelo colunista da CH On-line em dois artigos: “Uma história de sorte e sagacidade” conta como foi descoberto o grafeno, e “Promessas tecnológicas do grafeno” explica por que o material suscita tanta expectativa entre pesquisadores.
Fred Furtado
Ciência Hoje/RJ
sábado, 9 de outubro de 2010
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